Luís
Alberto Alves
Ônibus lotado, numa manhã chuvosa, ela sobe com
o filho de dois anos no colo e a sacola de roupas, além da sua. Franzina segura
na alça de ferro para não cair, após o motorista sair velozmente. Por alguns
minutos a maioria dos passageiros homens finge não vê-la. Após várias sacudidas
nas curvas e ruas esburacadas, consegue sentar.
Já castigada pela idade e sofrimento, depois
de quase 8 horas de viagens, a velhinha está no pátio do presídio da cidade de
Presidente Prudente, cerca de 700 km de SP. Trouxe a comida solicitada pelo
filho condenado a 80 anos de cadeia. Duas vezes ao mês repete o martírio de
sair de casa na periferia, pegar o ônibus às 21h do sábado e chegar às 5h da
madrugada em Prudente. Tudo para levar amor ao seu menino, que mesmo
amaldiçoado pela Justiça, continua sendo o grande amor dela.
A disposição para limpar casa de família não é
a mesma de 20 anos atrás. Porém, como não nasceu em berço de ouro, é preciso
enfrentar forno quente para assar bolo e salgados, além de cozinhar, lavar e
passar. Separada do esposo, que a trocou por outra mais nova, após dez anos de
casamento, esse é o recurso honesto para não deixar a fome e a miséria fixarem
residência no lar.
Trabalhar de garçonete não é tarefa fácil em
qualquer bar ou restaurante. Mas quando se fica viúva antes dos 20 anos, com
dois filhos para sustentar, é necessário ignorar as cantadas de fregueses sem
caráter. Várias horas de pé, os braços e pés doendo, a cabeça latejando de
tantas conversas sem pé e cabeça. Mesmo assim tudo é esquecido, quando chega em
casa e recebe o abraço caloroso dos filhos e declaração de amor, inocente como
toda criança faz.
Mais cruel quando o recurso usado para
espantar a fome da mesa é exercer a profissão mais antiga do mundo. Enfrentar
homens drogados ou alcoolizados, de hálito podre, sugando o seio, na ânsia para
sufocar a fome de prazer. O ritual é repetido há três anos, ao perceber que o
mercado de trabalho fecha as portas para quem tem baixo nível escolar. Difícil
é responder para a filha de seis anos o motivo de usar bastante maquiagem e
perfume cada vez que sai de casa.
Mas dor maior ficou reservada para aquela
mulher amorosa, mãe de um dos maiores homens já visto nesta Terra. Por semear a
paz, o amor e o Reino de Deus, acabou crucificado numa cruz. O coração partido
ao visualizar a vida saída do seu ventre 33 anos atrás se torcendo e morrendo
aos poucos. Inerte ela não pode fazer nada, apenas chorar e testemunhar que
somente o amor de mãe é incomparável, difícil de explicar, porém sincero e
eterno.
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