Blitz da PM na década de 80 na Baixada Fluminense (RJ) |
Luís
Alberto Alves
Pelé de boca fechada é artista. Numa
entrevista recente afirmou que se brigasse por racismo iria processar diversas
pessoas. Como futebolista é o rei do futebol, mas nunca teve personalidade para
defender a população negra. Passa longe do caráter de um Martin Luther King,
Jesse Jackson, Nelson Mandela, Stockely Carmichael, Leci Brandão, Martinho da
Vila. Algumas pessoas que sempre lutaram pela dignidade dessa parcela da
população Brasileira, tão humilhada e discriminada.
Omissão é a marca registrada de Pelé |
Ele desconhece que se for para falar besteira,
o melhor é ficar calado. O rei do futebol é mestre na insistência de negar a
existência de racismo no Brasil. Na opinião dele, o problema é que os negros
confundem discriminação social com racismo. Não é verdade. Pelé foi gênio
jogando futebol, o maior atleta de todos os tempos nesta modalidade esportiva.
Porém, como personalidade que deveria usar o cacife para obter conquistas a
essa parcela da população, é o um zero à esquerda.
Nunca teve caráter. No linguajar popular é o
famoso cagão. Prefere lamber as botinas dos poderosos a tentar entrar em
confronto. Na Seleção Brasileira nunca teve peito de discutir táticas de jogo
com o técnico. Na equipe tricampeã de 1970, era o canhotinha de ouro, Gérson
quem puxava o cordão prensando o técnico paraqueda Zagalo na parede para
sugerir melhor esquema para enfrentar os adversários.
A filha Sandra Nascimento, que Pelé recusou reconhecer |
Pelé cita sempre os Estados Unidos, onde diz
que ali existe racismo, de fato, não é como o Brasil. Tem razão nesta
colocação. Mas a discriminação racial brasileira é pior do que a norte-americana:
aqui tudo é de forma subliminar. Durante muitos anos os classificados de
empregos traziam a triste expressão “boa aparência”. Ela significava que o
candidato não poderia ser negro. A insistência de sindicalistas e intervenção
junto ao Congresso Nacional proibiu anúncios desse tipo e os classificou como
racistas.
Enquanto nos Estados Unidos o negro sabe,
mesmo ocupando altos cargos, que sempre será alvo de discriminação racial,
exclusivamente por causa da cor da pele, no Brasil as autoridades tentam tapar
o sol com a peneira. Criam expressões como: homem de cor, moreno, pardo,
mulato, preto de alma branca, para carimbar os negros que se conformam com a
situação sem nunca lutar por mudanças.
A lenda do boxe, Muhammad Ali comunicando que não iria prestar o Serviço Militar |
Pelé nunca foi parado em blitz da PM,
principalmente de madrugada na periferia. Jamais perdeu emprego por causa da
cor (como já aconteceu comigo), também não sentiu a triste experiência de
alguém dizer que aquele erro só podia ter ocorrido, por que o funcionário (no
caso esse jornalista que vos escreve) era “preto”.
Provavelmente transitou pouco pelas cidades do
Interior de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, onde o racismo é muito forte. Como
teve o nome associado ao futebol e ganha bastante dinheiro neste segmento de
mercado, ninguém irá lhe ofender, pois corre o risco de se queimar entre a
mídia esportiva.
Pastor e líder pacifista Martin Luther King |
Em mais de 50 anos de vida, nunca vi Pelé
defender nenhum negro que tenha sofrido qualquer violência racial. Não me
lembro de ele abrir sua boca num discurso do Dia 13 de Maio, quando se comemora
a falsa libertação dos escravos no Brasil. Aliás, sempre esteve ao lado do
opressor, de quem pisa na população negra. Na época da Ditadura Militar ficou
de bico fechado. Não usou a popularidade e carisma no futebol para criticar os
absurdos cometidos pelo Regime Militar.
Afinal de contas o que devemos esperar de
alguém que recusou reconhecer, mesmo após teste positivo de DNA, a filha Sandra
Nascimento, fruto de um relacionamento com uma empregada doméstica na década de
1960 em Santos? Pelé não teve a sensatez de aceitar que era pai daquela jovem,
cujas fotos revelam que ambos se parecem muito. Fugiu pela tangente, tática
empregada pelos covardes e omissos.
No velório de Sandra, morta por um feroz
câncer, inventou a desculpa que passava mal neste tipo de evento. Preferiu
enviar uma coroa de flores, prontamente recusada pela mãe da falecida. Infelizmente
Pelé não tem nenhuma moral para tecer qualquer tipo de comentário a respeito de
racismo, por que não age e nunca agiu igual um negro. Pelo contrário, sente
vergonha da pele escura.
Líder negro Stockley Carmichael |
Não teve a grandeza e postura de um Nelson
Mandela, que preferiu amargar várias décadas na cadeia, a trair os ideais do
seu povo. Recusou imitar o gesto do pastor Batista Martin Luther King, que
lutou até fim e perdeu a própria vida, para que a população negra dos Estados
Unidos ficasse livre da discriminação e pudesse, inclusive, ter acesso ao voto
na década de 1960.
Também passou longe da postura do supercampeão
de boxe, Muhammad Ali. No auge da Guerra do Vietnã preferiu ir preso, a se
alistar no Exército americano e pegar em armas para lutar e matar soldados
vietcongs. Ou mesmo o reverendo Jesse Jackson, braço direito de Martin Luther
King, árduo batalhador pelo cumprimento dos direitos civis nos Estados Unidos.
O que dizer do líder político Stockely Carmichael? Enfrentou a fúria da CIA e
FBI para mostrar ao governo de Lyndon Johnson (vice-presidente de John Kennedy
na década de 1960), que jovens negros não poderiam ser mercadoria farta para a
indústria de armas.
Ou mesmo em terras brasileiras, Pelé nunca
teve a postura de um Martinho da Vila, árduo defensor das causas da população
negra. Ou mesmo de Paulinho da Viola, que no final da década de 1960, quando a
Ditadura Militar resolveu começar a matar os opositores ao regime, teve a
coragem de compor a linda “Sinal Fechado”, numa clara crítica à falta de
democracia no País. Ou mesmo do talentoso Tim Maia, que nos momentos de
lucidez, escrevia e cantava canções revelando o quanto o racismo fazia mal ao
Brasil.
Os exemplos são vários. Infelizmente Pelé vive
em outro mundo. Talvez de conto de fadas. Onde o negro brasileiro é brigadeiro
na Aeronáutica, almirante na Marinha ou general no Exército. Nessa ilusão, onde
está mergulhado o rei do futebol, negro não é sinônimo de bandido ou
desonestidade. Está em grande número nas universidades públicas, inclusive na
USP (Universidade de São Paulo) e no curso de Medicina, onde a maioria dos
candidatos é de pele escura. Nessa alucinação onde Pelé está inserido, o negro
ocupa cargos de confiança nas grandes empresas e é minoria nas favelas...
Nenhum comentário:
Postar um comentário