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Radiografia da Notícia
*Todos esses fatores, sem dúvida, contribuem para a formação de um
ambiente propício ao crime
*A produção, que retrata com crueza a violência juvenil
*Alguns têm talento para a música, outros para o esporte; há os que
possuem sensibilidade aguçada
André Naves
Muito já se falou, e muito ainda há de se falar, sobre a série
“Adolescência”. A produção, que retrata com crueza a violência
juvenil, já foi esmiuçada sob diversos ângulos: a comunidade hostil, a
educação precária, o bullying, a influência nefasta das redes sociais
e a desestruturação familiar. Todos esses fatores, sem dúvida,
contribuem para a formação de um ambiente propício ao crime. No
entanto, há uma dimensão que tem sido negligenciada nas análises: a
responsabilidade individual.
É verdade que uma sociedade violenta e uma escola falida podem criar
condições para o surgimento de doenças sociais, como a intimidação e a
agressão entre jovens. Mas isso não significa que o indivíduo esteja
fadado a sucumbir a esse ciclo. A individualidade – esse conjunto
único de aptidões, potencialidades e limitações que cada um carrega –
é justamente o que nos permite resistir às piores circunstâncias.
Alguns têm talento para a música, outros para o esporte; há os que
possuem sensibilidade aguçada, e há os que, por enquanto, não
descobriram nenhuma habilidade específica. E tudo bem. A diversidade é
a essência da humanidade.
Vivemos em comunidade justamente porque nossas forças e fraquezas se
complementam. A vida coletiva só faz sentido quando cada um é
respeitado em sua autonomia, em sua capacidade de escolha. E é aí que
entram os Direitos Humanos: não como um escudo para justificar a
irresponsabilidade, mas como um instrumento de emancipação. O
verdadeiro respeito aos Direitos Humanos não está em infantilizar o
indivíduo, tratando-o como vítima eterna das circunstâncias, mas em
reconhecê-lo como protagonista de sua própria história.
Fantoche
Por isso, causa estranheza – para não dizer indignação – ver análises
que transferem a culpa do criminoso para a "estrutura social". Sim, a
comunidade tem sua parcela de responsabilidade. Sim, a escola, a
família e as políticas públicas falharam em muitos aspectos. Mas quem
cometeu o crime, quem alimentou a fogueira do ódio, quem escolheu o
caminho da violência foi o indivíduo, e só ele. Tentar diluir essa
responsabilidade é reduzir a pessoa a um mero fantoche do meio, é
negar sua capacidade de agência. E nada é mais antiético, mais
contrário aos Direitos Humanos do que essa visão que transforma seres
humanos em eternos coitados, incapazes de responder por seus atos.
Direitos Humanos não são – e nunca foram – sinônimo de impunidade.
Pelo contrário: quem é livre para agir deve ser responsabilizado por
suas ações. Essa poderia ser a síntese dos Direitos Humanos e a base
de qualquer sociedade que se pretenda Justa.
P.S.: A série acerta ao retratar as instituições policiais e
judiciárias com equilíbrio. A lei é implacável, mas justa; a repressão
ao crime é eficiente, mas dentro dos limites éticos. É assim que se
faz segurança pública: sem abrir mão dos Direitos Humanos – porque, no
fim das contas, o maior direito de todos é viver em uma sociedade onde
cada um tem a Liberdade de responder por suas escolhas.
André Naves é Defensor Público Federal formado em Direito pela USP,
especialista em Direitos Humanos e Inclusão Social; mestre em Economia
Política pela PUC/SP.