A editora Abril é outro exemplo de derrocada após dominar o
mercado de publicação de revistas por mais de 50 anos e faliu
Luís Alberto Alves
O maior erro que um partido político comete, após chegar ao
poder, é se acomodar. Esquecer as suas origens, as batalhas e os aprendizados
que o levaram até o patamar atual. Grandes impérios caíram por causa da
preguiça que se instalou depois de diversas conquistas.
Foi assim com Alexandre, o grande; com os romanos, os persas,
os gregos. Foi assim, na área empresarial, com o poderoso Diários Associados,
responsável pela criação da primeira emissora de televisão no Brasil, em 1950,
e proprietário de imensa rede de jornais, revistas e numerosa emissoras de
rádio.
Elite
A editora Abril é outro exemplo de derrocada após dominar o
mercado de publicação de revistas por mais de 50 anos e faliu. Quando chegou ao
auge, se acomodou. Ignorou a chegada de novas tecnologias no segmento de
comunicação em massa.
O PT, fundado no início da década de 1980, demorou 23 anos
para conquistar a presidência da República. Ralou muito. Foi alvo de chacota,
de perseguição da grande mídia, alimentada pelo dinheiro da nossa elite, a mais
atrasada do planeta. Permaneceu no comando do Brasil, 16 anos. Primeiro com
Lula, reeleito e depois com Dilma Rousseff, sacada da presidência num golpe de
estado com aval do Congresso Nacional.
Mas enquanto esteve no comando, de 2003a 2016, primeiro com
Lula e depois com Dilma, o PT abaixou a guarda, mesmo quando teve maioria no
Congresso Nacional. Em vez de passar o rolo compressor e aprovar e colocar em
prática os seus projetos, ficou como jogador de futebol que dribla muito na
área em vez de chutar a bola e marcar o gol. Agora colhe os frutos amargos
dessa infantilidade.
Tiro
Em política não existe amadores, nem muito menos compaixão. É
a regra dura da sobrevivência. O grande capital, que financia os seus
parlamentares, vai jogar pesado para que nenhum projeto que coloque em risco a
sua sobrevivência seja aprovado. Resultado disso é a reforma trabalhista de
2017, que foi um tiro de canhão contra as conquistas dos trabalhadores. Sempre
será assim, no Brasil e em qualquer lugar deste mundo.
A população pobre se preocupa com três itens para continuar
sobrevivendo: segurança, educação e saúde. O que sair disto é chover no
molhado. Na periferia, onde mora o grosso do eleitorado, qualquer pessoa
precisa sentir segurança, que não será alvo de assalto, de homicídio quando
sair para trabalhar. Deseja que a sua família esteja segura. O mesmo se aplica
à classe média, porque os milionários têm respaldo dos seus leões de chácaras e
carros blindados.
A educação de qualidade para que os filhos deste trabalhador
possam ter condições de prestar vestibular e conseguir aprovação. Educação
significa boa escolas públicas, com professores ganhando salários dignos e
condições ideais para o exercício de sua profissão. Essa educação precisa ser
ótima desde a Ensino Infantil ao Ensino Superior. É algo que exige alto
investimento dos governantes.
Rede
Saúde é algo que jamais poderá ficar de fora. Ninguém
consegue trabalhar doente. Nenhuma empresa contrata funcionário que esteja com
a saúde debilitada. Não é novidade que a saúde pública está sucateada. O SUS se
encontra na UTI e parte do Congresso Nacional, sob bençãos do lobby da rede
privada, tenta a todo custo destruí-lo. Por outro lado, um país que tenha mão
de obra doente nunca será uma nação evoluída.
Mas infelizmente, os partidos de esquerda, incluindo o
próprio PT, caíram na armadilha de viajar na “maionese” discutindo projetos de
lei de interesse de minorias, como se os objetivos da minoria devessem passar
por cima da maioria. Esqueceu a regra básica da votação de assembleia de
trabalhadores, onde prevalece o que a maioria aprovou, após ampla discussão.
Todas as propostas devem ser discutidas, mas sem esquecer do macro.
Trabalhador, o grosso do eleitorado, não está interessado em
conversa de “bicho grilo”. Ele não quer saber se é errado chamar alguém de
homem ou mulher, descasado ou solteiro, favela ou comunidade, desempregado ou
sem recurso financeiro. Para ele vai interessar sempre ter dinheiro para não
passar fome, saúde e boa escola para os seus filhos. O que passar disso é papo
de intelectual, que encontra solução para tudo enquanto está bebendo na mesa do
boteco.
Cabeça
A direita não é burra como insinua muitas pessoas. Ela não se
divide, como ocorre com a esquerda. Tem foco e luta para concretizar os seus
objetivos. Percebeu o vácuo deixado pelos partidos de esquerda na periferia e
foi para lá vender o seu peixe embolorado com imagem de bom. Colocou na cabeça
dos jovens que ele poderia ser empreendedor trabalhando mais de 12 horas por
dia entregando comida ou mercadoria comprada pela internet, ganhando migalhas.
Igual água que tanto bate em pedra dura até que fura, esse
discurso encontrou eco. Hoje, o Brasil tem mais de 1 milhão de trabalhadores
informais que se encaixam neste perfil, desde ciclistas entregadores a
motoristas que pegam as suas corridas em aplicativos. Qual proposta a esquerda
vendeu para esse exército de trabalhadores?
Hoje o foco mudou. Tudo gira em torno do digital. É nesta
praia que a esquerda precisa fazer as suas discussões. Ícones da década de 60,
70 e 80 não são os mesmos dessa nova classe de trabalhadores. Eles não gastam o
seu suado dinheiro comprando CDs, mas baixam as suas canções preferidas na
internet. Os seus artistas são outros. São jovens que resolveram descrever a
dura realidade de onde vivem, com o seu próprio linguajar, às vezes bruto.
Empresa
Para nós que passamos dos 60 anos, como é o meu caso, é
preciso abrir a visão e constatar que a realidade atual é diferente dos anos de
chumbo do regime militar. O discurso é outro. O trabalhador de hoje é
imediatista. Não lê jornal de sindicato, mas se informa pelas redes sociais
sobre o que acontece no local onde trabalha, quando tem a sorte de ser
contratado por uma empresa. É rápido. Deseja que os seus questionamentos sejam
contemplados de forma imediata. Não vai perder tempo com longas teses, como era
rotina no sindicalismo das décadas de 60 até 90.
Hoje a informação circula rapidamente. É algo instantâneo. É
preciso que a esquerda brasileira coloque os seus pés no chão e perceba que o
tempo mudou. Invista em lideranças sintonizadas com o momento atual. Deve
arquivar os discursos que estiveram na moda no século passado. Estamos em novos
tempos. A roda girou. É preciso abrir os ouvidos e saber o que o trabalhador de
hoje quer falar. Não querer ser o dono da verdade. É preciso reciclar. Até o
sindicalismo precisa adotar outra postura. Não perder tempo com discussão
inútil.
Hoje, caso Lula morra, quem a esquerda tem para colocar no
seu lugar? Nos diversos partidos de esquerda existentes no Brasil, quais são as
lideranças que realmente têm condições de discutir em pé de igualdade com os
líderes que a direita tem colocado na arena? Na área da comunicação de massa,
qual investimento a esquerda faz para se aproximar da periferia? O próprio Mano
Brown já está próximo de ser idoso. Atualmente tem 54 anos. Quem o substituirá?
Momento
O tempo não espera ninguém. Nem muito menos tem compaixão.
Igual veloz carro de corrida, continua seguindo adiante na sua trajetória. O
momento é de sentar e criar estratégias de como virar esse jogo. É momento de
calçar as sandálias da humildade, deixar de lado o complexo de ser o dono da
verdade (ninguém é, porque cada um nós temos as nossas verdades) e sair da zona
de conforto. Ir até a periferia e entender os anseios da população.
Conversar com os jovens e ouvir as suas propostas. As suas
ideias, os projetos que têm para o futuro que se aproxima todo o dia, porque o
dia de ontem já é passado. Ir aos bailes que eles fazem nas ruas, bater papo
com as lideranças musicais que fazem sucesso entre essa parcela da juventude.
Se aproximar das mulheres que ganham o pão de cada dia vendendo salgadinhos na
porta de casa, na porta do metrô, do ponto de ônibus, no rapaz que rala entregando
pizzas durante a noite e mercadorias compradas pela internet durante o dia.
Arquivar os discursos de luta de classe, que fizeram a cabeça
de muita gente no século passado, mas hoje não encontram mais eco entre a geração
que nasceu depois de 1995. Para esse novo eleitor, o importante é o dia de hoje
e o de amanhã. Ele está cansado de ouvir falar do passado. A esquerda precisa
deixar de lado a mania de querer ser a dona da verdade. Se este leque não se
abrir, vai chegar o dia que nem eleição de síndico a esquerda vai vencer.